sexta-feira, 29 de janeiro de 2016

Vergílio Ferreira, um escritor que é também filósofo

Comemora-se este ano os cem anos do nascimento de Vergílio Ferreira.
Vergílio Ferreira não nos deixou apenas romances. Embora sejam eles que representam o fundamental da sua obra, o seu interesse pela filosofia levou-o a traduzir obras filosóficas e a escrever ensaios. 
Vergílio Ferreira, 1988 (foto retirada de http://www.dn.pt/artes/interior/vergilio-ferreira-o-professor-que-queria-ser-amado-5002752.html)

Apresentamos a capa de O Existencialismo é um Humanismo - conferência proferida na Sorbonne em 1947 pelo filósofo francês Jean-Paul Sartre e publicada originalmente nesse mesmo ano - traduzido e anotado para língua portuguesa por Vergílio Ferreira. É uma obra que nos ajuda a compreender a corrente filosófica denominada como existencialista e é antecedida por um ensaio de Vergílio Ferreira, datado de 1961, sobre aquele filósofo.



Transcrevemos uma passagem do ensaio de Vergílio Ferreira que se refere a um dos conceitos mais importantes na filosofia de Jean Paul Sartre - o de Liberdade. Procurámos uma referência que pudesse ser mais facilmente inteligível pelos potenciais leitores deste blogue...Não há muito, os nossos alunos andaram às voltas com o problema do livre-arbítrio...

«...em face desses factos irredutíveis - o nascer e o morrer - eu posso assumir uma reação (de aceitação, de repúdio, de alegria, de tristeza, etc.). Um facto de que não sou responsável, enquanto facto que é abre-me a possibilidade da minha reação em face dele. (...) Do mesmo modo, à condição rácica, social ou epocal que me coube por nascimento, eu a posso assumir, enfrentar, abrindo nela a possibilidade de me afirmar livre e responsável.»
(Vergílio Ferreira, «Da Fenomenologia a Sartre» em J.-P. Sartre/Vergílio Ferreira, O Existencialismo é um Humanismo, Lisboa, Editorial Presença,s/d, p. 137)

quinta-feira, 28 de janeiro de 2016

Auschwitz foi libertada a 27 de janeiro de 1945 - Dia Internacional da Lembrança do Holocausto


Faz hoje 71 anos. A idade de muitas pessoas que conhecemos. Foi há muito pouco tempo. Foi há tanto tempo.








Isto é o inferno. Hoje, nos nossos dias, o inferno deve ser assim: uma sala grande e vazia, e nós, cansados, de pé, diante de uma torneira gotejante mas que não tem água potável, esperando algo certamente terrível , e nada acontece, e continua a não acontecer nada. Como é possível pensar? Não é mais possível; é como se estivéssemos mortos. Alguns sentam-se no chão. O tempo passa, gota a gota. Primo Levi, “Se Isto é um Homem” (1947)

Primo Levi, aos 24 anos, foi transportado para Auschwitz. Ele e outros seiscentos e cinquenta judeus italianos. Estávamos em fevereiro de 1944. Deles, só vinte sobreviveram — Levi incluído. Quando se viu, enfim, libertado pelo exército soviético, a 27 de janeiro de 1945, ao fim de 11 meses de privação e indignidade humana, Levi havia envelhecido, não 11 meses, mas décadas. Não só fisicamente. Mas serviu-lhe a experiência, de morte, não a sua mas a que testemunhou dia-a-dia à sua frente, todos os dias, a experiência de sobreviver quase miraculosamente — a resiliência fez o resto –, essa experiência-limite permitiu-lhe escrever, por exemplo, “Se Isto é Um Homem” (a trilogía de Auschwitz completa-se com “A Trégua” e “Os que Sucumbem e os que se Salvam”).
(texto retirado de http://observador.pt/2016/01/27/horror-auschwitz-do-holocausto-escreveu-na-primeira-pessoa-primo-levi/)

Como foi possível Auschwitz? Esta pergunta ainda não tem resposta. Ainda nos fere e incomoda. E não podemos descansar enquanto não percebermos o que o tornou possível. E não podemos descansar enquanto não percebermos de que são feitos os homens que matam outros homens, enquanto não percebermos como o mal se pode tornar a normalidade. Enquanto não percebermos, o horror pode voltar.

Quem pode dizer, perante os sinais do mundo de hoje, que podemos estar descansados?